Talvez, aquela noite, com o
cigarro de canto de boca, rabiscando um guardanapo em cima da mesa, fosse o dia
certo para pensar em tudo que passou. O tempo de espera. Saber como era estar
há minutos de um acontecimento sem saber se esses minutos se estenderiam por
horas de uma angústia que não teria fim enquanto durasse. O copo meio vazio à
minha frente tinha as marcas dos meus dedos, um drinque sem gelo, o copo quente
e lá, as marcas de meus dedos engordurados, à espera.
À espera de um ato qualquer que
mudasse a trajetória dos acontecimentos dos dias idos, semanas, meses, anos
atrás. Saberia agora o que sente a senhora, de cotovelos na janela, aguardando
seu amado companheiro a voltar da guerra. Sem promessa alguma de que isso se
realizaria. Seria muita sorte se no lugar, ganhasse os braços do seu amado e
não um saco preto e uma carta com os pesares das forças armadas, enaltecendo o
bravo guerreiro que foi. A espera é o inferno.
Estar ali, na curva da esquina
sem saber o que vem: Jack, o estripador ou amor da sua vida, uma revolução ou a
guerra sem sentido. A espera é estar ali, numa suspensão do próprio devir e do
ser, formado até ali. É um não estar e não pisar em parte alguma.
Ah, aquela noite! Aquela noite
prometia, como prometia, aguardava, já suado, sofrendo de véspera, poeta do
acaso e ocaso sem nada a temer, à não ser a espera, maldita e ininterrupta.
O cigarro acaba. Acendo outro.
Peço mais um drinque. E continuo à rabiscar coisas aleatórias no papel. Um
número, uns versos, quem sabe um ensaio sobre o que vou dizer. Penso e cogito
as possibilidades dessa noite tão agradável aqui, em São Gonçalo. Começo a
divagar sobre a beleza do lugar e sobre as cadeiras de madeira dos barzinhos na
beira dessa rua. O vai e vêm das pessoas apressadas saindo do metrô. Esse clima
de que tudo pode acontecer, sexta-feira, todos celebram! Fim do expediente. A
garota sai do prédio com sua habitual roupa de trabalho. Senta com uns amigos e
começa a beber bem próximo a minha mesa. Eu à escutar toda a conversa sem muito
sentido do seu dia estafante de trabalho, como o Rodrigo ou o Paulo ou o Sérgio
ou o Augusto ou o Dr. Castro ou o bosta do Barbosa tinham sido escrotos ao
longo da semana.
Mas a espera continua. Mantendo
em suspenso qualquer coisa. E os rumos da conversa me desinteressam.
Até a Renata me pedir um
fósforo. Nome Renata, sim. A mesma que falava e falava com mais dois amigos e
uma amiga na mesa ao lado. Acendi o cigarro da moça e voltei novamente aos meus
rabiscos e a minha contemplação. "Obrigada"; "de nada".
Seguem-se os rumos e nada acontece.
Não sei se esse vazio que
permeia de certa incerteza as conversas cotidianas é algo que me incomoda ou me
atrai. Se é um fascínio pelo genuíno ou pelo grotesco do nada em que os comuns
são imersos dia após dia.
E a espera, a espera estava ali, áspera,
à espera comigo, a noite toda.